Cigarro “light” não existe

Ao ler a reportagem “Cor de maço de cigarro pode influenciar decisão de fumar”  é importante nos atentarmos para dois pontos. O primeiro consiste em perceber que as embalagens de cigarro influenciam no consumo de seu produto e conseqüentemente devem ser consideradas como uma forma publicidade. Sem contar com todo o investimento que a indústria do cigarro faz para atrair públicos específicos – por meio do planejamento minucioso que visa associar algum elemento característico, seja dos jovens e crianças, da mulher, ou do próprio adulto – os maços de cigarro também são idealizados pela indústria no sentido de dissociar o tabagismo dos malefícios à saúde e apresentá-los como uma alternativa a parar de fumar.

Isso nos leva ao segundo ponto. As pessoas ainda acreditam que existem níveis seguros para a saúde quando estamos falando do consumo de cigarros, e que o principal meio para se atingir isso são os cigarros que anteriormente foram intitulados, pela própria indústria, como “lights” ou com baixos teores de nicotina e alcatrão.

Mas isso não veio a toa. Por meio da sentença da Juíza Gladys Kessler**, podemos perceber que, “desde os anos 1970, os Réus (indústrias tabagistas) vem enganando os consumidores, fazendo-os acreditar que os ditos cigarros light ou com baixos teores de alcatrão seriam mais saudáveis que os outros. E o fazem sabendo há décadas que os cigarros light não oferecem nenhum benefício comprovado para a saúde.”

A partir deste mesmo documento, podemos expor alguns argumentos no sentido de demonstrar que cigarro light não existe:

-Os teores de alcatrão e nicotina contidos no cigarro são calculados por uma máquina de “fumar”, que traga os cigarros em baforadas com volumes definidos de fumaça, em intervalos regulares, por um determinado período de tempo. Conforme a fumaça vai sendo tragada pela máquina, passa por um filtro conhecido como tampão Cambridge, que retém as partículas de alcatrão.

-No entanto, este método pode fornecer resultados equivocados, pois o vício em nicotina leva os fumantes a buscarem uma dose relativamente estável de nicotina, de modo que a necessidade real do consumo das substâncias contidas no cigarro, não corresponde com a precisão da máquina, que traga o cigarro de forma sistemática e não-humana.

-Assim, quando os fumantes consomem um cigarro com baixos teores de alcatrão podem passar por um mecanismo de compensação destas substâncias por duas maneiras: “fumando os cigarros mais intensamente, aumentando o volume de fumaça inalada, tragando mais vezes ou mais intensamente, fumando o cigarro até bem perto do filtro e bloqueando os poros do filtro do cigarro, que diluem a fumaça ou simplesmente fumando mais cigarros.”

-“Como cada fumante busca satisfazer sua necessidade particular de nicotina, acaba por inalar a mesma quantidade dessa substância – e de alcatrão – seja fumando os chamados cigarros “com baixos teores de alcatrão e nicotina”, seja tragando cigarros “regulares”… Praticamente todos os fumantes (mais de 95%) compensam a redução da nicotina.”

-Desta forma, em 2001, a própria Diretoria Colegiada da Agência Nacional de Vigilância Sanitária editou a Resolução nº46, que expõe:

“Considerando que os consumidores dos cigarros não diferenciam os riscos da exposição a altos, médios e baixos teores de alcatrão, nicotina e monóxido de carbono, tornando assim, imprescindível que haja uma extinção das terminologias utilizadas para caracterização dos referidos produtos, pois além de não serem esclarecedoras ao consumidor, propiciam mensagens dúbias na publicidade desses produtos”

“Art.2º É vedada a utilização de qualquer denominação, em embalagens ou material publicitário tais como: classes (s), ultra baixo(s) teor(es), baixo(s) teor(es), suave, light, soft, leve, teor(es) moderado(s), alto(s) teor(es), e outras que possam induzir o consumidor a uma interpretação equivocada quanto aos teores contidos nos cigarros.

Mesmo com este decreto da ANVISA que proibiu a designação “cigarros light” e outras denominações equivocadas, as cores dos maços ainda são mantidas pela indústria com o intuito de preservar a idéia de um cigarro menos prejudicial à saúde e que, infelizmente, ainda pode persuadir muitos consumidores, que se sentem mais seguros ao fumar o cigarro de embalagem mais clara.

*http://oglobo.globo.com/saude/cor-de-maco-de-cigarro-pode-influenciar-decisao-de-fumar-3528755#ixzz1iJwt3nc3

**http://actbr.org.br/uploads/conteudo/176_sentencaKesslertraducao.pdf

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