A boa notícia entre o caos do combustível

11.06.18


Jornal do Brasil - Paula Johns e Ana Paula Bortoletto

Em meio aos cortes de programas sociais anunciados para compensar a queda no preço dos combustíveis, na semana passada tivemos a boa surpresa de que o governo federal reduziu de 20% para 4% a alíquota de Imposto sobre Produtos Industrializados dos concentrados produzidos na Zona Franca de Manaus. Isso significa que, com o decreto 9.393, publicado no último dia 30, o crédito que os fabricantes de bebidas adoçadas têm direito por comprar o concentrado produzido na Zona Franca seja bem menor. 

A Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável denuncia a incoerência na política fiscal há tempos. Uma série de reportagens do site de jornalismo investigativo “O Joio e o Trigo” já mostrou que tal política faz com que o setor chegue a dar prejuízo para o governo. O cálculo conservador é de que ao menos R$ 7 bilhões são dados anualmente ao setor, entre impostos federais e estaduais. O subsídio gira em torno de R$ 0,15 a R$ 0,20 por lata, e chega a R$ 0,50 nas garrafas de dois litros. 

Entendemos que os incentivos fiscais são usados, em determinado período, para ajudar alguns setores da economia. Mas eles precisam de revisão, ou porque o setor desenvolveu-se a contento, ou porque os resultados esperados não foram de fato alcançados, ou ainda porque a pressão da sociedade demanda que determinados privilégios não devam mais ser prioridade para o desenvolvimento do país. Há casos, como acontece com as bebidas adoçadas, em que tais incentivos acabam por não compensar os efeitos negativos causados: são as chamadas externalidades. Por isso a política de incentivos precisa ser repensada. Ela não está harmonizada com a de saúde pública. 

Somente a diabetes cresceu mais de 60% nos últimos dez anos. Atualmente, com 82 milhões de obesos, o Brasil é o terceiro país com maior número de homens obesos no mundo e o quinto entre as mulheres obesas.  De acordo com a Organização Mundial da Saúde, a obesidade é uma das principais epidemias da atualidade. Relatório do Banco Mundial e artigo recente na revista científica inglesa “The Lancet” mostraram que tributar produtos não saudáveis é uma das ferramentas políticas indispensáveis para melhorar a saúde pública, salvar vidas e gerar recursos para investir no desenvolvimento humano. 

Soubemos que parlamentares que representam os interesses da indústria de bebidas adoçadas e da Zona Franca estão articulados lutando contra o decreto. Lamentamos e esperamos que não haja retrocessos nesse ponto. 

O governo federal, e destacamos a Receita Federal, precisa avançar na política tributária. A Zona Franca deve ser entendida como uma região para incentivar a produção de itens não danosos à saúde ou ao meio ambiente. 

O setor de bebidas ultraprocessadas, assim como o de tabaco e de álcool, merece uma atenção especial no desenho e execução de novas políticas públicas que busquem tanto ampliar a base tributária de receitas como desencorajar a frequência e intensidade do seu consumo. Assim, é necessário adequar a tributação observando o impacto negativo que seus produtos causam à saúde e avançar com as políticas. Além do mais, sabemos que são produtos subtaxados em relação a outros países. No caso de bebidas adoçadas, quase 40 países ou estados já adotaram tributação especial na tentativa de enfrentar os problemas causados pela obesidade. 

Há diversos incentivos tributários federais para produtos não saudáveis que o governo poderia reexaminar com mais atenção. Esperamos que a experiência do setor de bebidas ultraprocessadas encoraje um aprofundamento estratégico de novas medidas reguladoras para setores relacionados.

* Socióloga ** Nutricionista Ambas fazem parte da Aliança pela Alimentação Adequada e Saudável




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